O Palhaço Tico Bonito, em Cascavel, cercado por policiais nada engraçados |
Tico Bonito, o
palhaço em questão, é um sujeito pequenino, miúdo, de aparência frágil. Mas é
claro que a força de um palhaço não se mede pelo volume dos músculos ou pelo calibre
da arma que carrega na cintura.
A arma do palhaço
é o riso, a graça, a irreverência. Há algo que o palhaço leve a sério? Poucas
coisas. Uma delas é o público, sobretudo as crianças. Mas um palhaço faz mais
do que isso. Fala para todos, diverte e faz rir e pensar a velhos e moços e
crianças, desde que tenham resquícios de alma infantil.
Pois lá estava o
Tico Bonito se apresentando no calçadão da cidade de Cascavel, Paraná,
participando de um festival infantil de teatro. Sua identidade civil é Leônidas
Quadra, mas ali ele é apenas o palhaço. As crianças e os adultos que estão a
sua volta se divertem.
É quando passa
pela rua lateral ao calçadão uma viatura policial. Tico Bonito, movido pela
irreverência natural a seu papel, comenta então que os policiais que ali
passavam eram serviçais do governador, defensores da burguesia, preocupados com
o centro da cidade e não com a periferia.
Como é sabido, a
reação de Tico Bonito reflete indignações ligadas a acontecimentos recentes,
quando tropas policiais do Estado do Paraná produziram uma batalha campal criminosa
contra professores que protestavam no Centro Cívico, em Curitiba. A pancadaria,
as bombas, deixaram feridas que ainda não cicatrizaram por completo – talvez
nunca cicatrizem. O palhaço sabia o que estava dizendo, mas os policiais
pareciam não saber o que estavam ouvindo.
Eles
estacionaram a viatura policial e se dirigiram ao palhaço anunciando que estava
sendo preso por desacato à autoridade. A autoridade, no caso, eram eles, três
policiais com o dobro de volume e o triplo de músculos. Para executar a
colocação de Tico no camburão, no entanto, os policiais precisaram de reforços.
Outros policiais chegaram, um deles com uma arma de grosso calibre em punho,
além de policiais a cavalo. A multidão tentou reagir, mas foi inútil. Tino
Bonito reagiu com energia, mas força bruta venceu.
Foi Tancredo
Neves quem disse certa ocasião, em plena ditadura, que temia mais o guarda da
esquina do que ao ditador de plantão. Foi o que se deu.
Tico foi submetido
a empurrões, pescoções, trancos. Reagiu valentemente, berrou, recusou-se a ser
enjaulado. Os populares em volta também interferiram, gritaram, empurraram, mas
de nada adiantou. Tico foi trancafiado depois de muita resistência e foi levado
para a delegacia.
Vamos lembrar
que o que Tico disse da política, embora possa ser discutível, expressa o
pensamento do Palhaço e do cidadão Leônidas Quadra. Aliás, expressa a opinião
de inúmeros pensadores, filósofos, educadores, sociólogos, jornalistas,
professores e de cidadãos comuns que clamam por paz e segurança.
O que fará a
policia? Irá prender a todos eles por desacato à autoridade? Arrogará a si o
direito de dizer o que é correto e o que não é correto se dizer a respeito dos
poderosos? Imaginam-se defensores de governantes ofendidos?
Equívoco
perigosíssimo. Imaginar que sua função de “manter a ordem” alcança o que pensam
as pessoas e o modo como elas expressam sua opinião é um sinal a mais do caos
sócio-político ao qual chegou nosso pobre país.
Deixemos os
palhaços em paz, portanto.
E que as
“autoridades” deixem de palhaçadas. Eles não são do ramo.
Na minha opinião, o palhaço perdeu o foco. Saiu do script, do seu papel. Não tinha que provocar e desrespeitar os policiais e a corporação justamente enquanto encenava seu espetáculo. Que culpa têm o soldado, o cabo, o sargento, o tenente, que são trabalhadores como o próprio Tico, ou o pipoqueiro da esquina, de que há pessoas e autoridades, como o governador, que gozam de certos privilégios, por força de lei ou não. Como artista preferido dos pequenos, deu um péssimo exemplo às crianças que o assistiam. Os policiais fizeram o que tinham que fazer e, pelo menos na presença do público, foram complacentes, não agiram com violência nem rigor excessivos. E olha que o rapazinho insistiu, tentou tirar os fardados do sério, para provocar uma grande confusão. Aliás, segundo o oficial que defendeu a PM no dia seguinte, na imprensa, verificou-se na delegacia que o elemento já é contumaz em armar barulho.
ResponderExcluirDiscordamos, é óbvio. O que não me parece estranho; estranho seria todos concordarmos. Mas assim como o amigo tem o legítimo direito de ter seu comentário publicado no meu blog, o Tico Bonito tem o direito de expressar suas opiniões (ele não ofendeu a ninguém, realizou ao vivo uma análise sócio-política...) em seus espetáculos, opinião que compartilha com cidadãos das mais diferentes classes, profissões e confissões. E nem eu, ou o amigo, ou o Tico poderemos ser silenciados por policiais que, pelo que sei, têm outras funções públicas a desempenhar. Alienar nosso direito de pensar, entregando-o às mãos de policiais equivale a um suicídio democrático. Já vivemos uma época em que isso era corrente. Policiais davam ou não licença para que atores ou escritores ou simples cidadãos exercessem esse direito humano e constitucional. Inclusive um delegado do DOPS que, segundo contou Paulo Autran, tendo assistido à peça Édipo Rei, mandou que seus agentes prendessem “esse tal de Sófocles” por incentivar o incesto e a imoralidade. Felizmente esses tempos passaram. Espero que o amigo não se sinta ferido pelos reparos que faço a seu comentário; não atinjo seu sagrado direito de pensar de outro modo, discuto apenas ideias, coisa que falta muito ao Brasil. Fique com o meu abraço.
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