domingo, 14 de setembro de 2014

A Majestade Presidencial



Marlon Brando em O poderoso chefão



Às vésperas da eleição presidencial, retomo um tema que já abordei aqui. Justifica-se: o tema é atual e penso que deveria ser ensinado com as primeiras letras aos jovens brasileiros.
Trata-se do livro “Sua Majestade o Presidente do Brasil” (1930), escrito por Ernest Hambloch, membro do Foreign Office e cônsul inglês no Brasil. Aqui morou cerca de vinte anos. Acusado de “denegrir a imagem do país”, voltou à Inglaterra às pressas. Os nacionalistas viam nele uma víbora a ser pisoteada.
Vamos à tese de Hambloch.
Diz ele que são equivocadas as análises que colocam as questões econômicas como núcleo teórico para explicar o Brasil. Não seriam as causas primárias e nada explicam. A seu ver, “as origens dos males do Brasil devem ser buscadas nos defeitos de seu regime político”.
Donos de conhecimento livresco, os brasileiros são incapazes de construir uma ponte mental para aplicação de suas “ideias” aos problemas nacionais. Nos debates eleitorais isso fica claro: um dilúvio de chavões desencontrados tentando pescar votos.
Nossos políticos, diz o inglês, discutem tramoias de políticos e não política propriamente. Eis porque nenhum deles incorpora qualquer credo político. As propostas são improvisadas e podem mudar de rumo a qualquer momento, quando assuntos mais apimentados ou delicados surgem. Oportunistas, “os brasileiros esqueceram-se de como pensar politicamente. Jamais lhes ocorreu formar partidos para advogar ideias”.
Na mosca: nenhum partido defende ideias; defendem slogans providenciados por marqueteiros – trata-se de uma caça aos votos. Oscilam em torno daquilo que é mais conveniente no momento, aderem a antigos inimigos ou vivem de permutas de interesses menores. Daí a conclusão genial: “A política no Brasil nada tem a ver com questões políticas”.
Neste ambiente, diz Hambloch, foi gerada a figura do Majestoso Presidente, criatura sem convicções. “O supremo Poder Executivo está nas mãos de um homem – o presidente – ao qual, e a ninguém mais, seus ministros são responsáveis. O próprio presidente não é responsável perante qualquer pessoa nesta terra durante seu período de presidência, e ninguém ainda inventou um meio prático de fazê-lo responsável depois!”
Sabemos disso.
Resultado: governos autocráticos e apego popular à imagem de um líder salvador, de uma figura forte e messiânica. Por isso candidatos devem fazer poses de durões invencíveis. “Uma ditadura em estado crônico, a irresponsabilidade geral e sistemática do Poder Executivo.” Segundo Hambloch, estes líderes desprezam o povo, que veem como clientela. Por isso, “os programas presidenciais são idênticos. Não há a mais leve suspeita de conflito de ideias políticas. A única ideia política é conseguir o poder”.
Como conclusão, escreve – há mais de 80 anos! – “Os primeiros frutos da autocracia são corruptos e geram a corrupção”.
E o fecho é incompreensível para cérebros tupiniquins: “Os princípios e sistemas democráticos não dependem de cartas constitucionais, mas de convicções. A fé vale mais do que o fato”.
Ocorre que para debater isso exigiria pensar politicamente.





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