O Brasil passa por um
período de esquizofrenia.
Sempre teve dificuldades
em aceitar a si mesmo. Quis ser português, negro, índio, e misturou as três
raças com sucesso – mas faltava algo. O quê? Não se sabia. Por isso, ao longo
do século XIX quis ser francês e, com a chegada do século XX, norte-americano.
Acabou resultando num país macaqueador de várias origens.
Hoje se repete à exaustão
Nelson Rodrigues: é um povo com complexo de vira lata. Ele bolou a frase pensando
no futebol, mas ela se tornou um conceito aplicável ao país.
Acrescento que, além de
vira-lata, é um país intelectualmente invertebrado. Não tem ossatura filosófica
que o sustente. Pensa ser generoso, criativo, mas os resultados deixam a
desejar. Imagina ser abençoado por Deus e bonito por natureza, mas passa férias
em lugares de turismo consumista e fútil, gastando nisso verdadeiras fortunas.
Sérgio Buarque de
Holanda, na obra Raízes do Brasil, o
descreveu o brasileiro como “homem cordial”. Poucos brasileiros leram a obra,
mas quem leu e quem não leu interpreta o conceito erroneamente. Imaginam que o
brasileiro é pacífico, bonzinho e incapaz de revoluções sangrentas. Sérgio Buarque
não disse nada disso. O homem cordial é aquele que se guia pelo coração (do
latim cor, cordis) e não por
construções intelectuais complexas. Um alemão representaria a racionalidade do
conceito, um inglês a racionalidade experimental e um americano o utilitarismo
empírico. O brasileiro, o coração. Que pode ser cruel, vingativo, violento,
tirânico – governado pelo coração.
Por isso, as escolhas
políticas brasileiras oscilam ao sabor dos ventos. Sem ossatura intelectual que
as sustentem, enaltecem a emoção. Cultivam líderes messiânicos, aguardam o
retorno de Dom Sebastião, imaginam que as disputas políticas e filosóficas são
variações de um Flaflu.
Comportam-se como
torcidas organizadas, fanáticas e toscas. Daí campanhas eleitorais esquizofrênicas,
em que se chocam personalidades supostamente capazes de conduzir o povo ao
paraíso. Discutir ideias, planos, projetos, alternativas racionais ou
empíricas, experimentar novas soluções, rever erros, construir e inventar algo
novo – nada disso está em jogo. Gira-se apenas em torno do apego emocional a um
líder, a um partido, a uma bandeira de torcida.
Restam os xingamentos.
Nas últimas eleições, termos pejorativos dirigidos aos inimigos foram urrados pelas
torcidas, que não sabia e continua sem saber o que estava urrando.
FHC, ao assumir, pediu
que esquecessem o que havia escrito. Lula, que nada escreveu, embarcou em
ventos favoráveis e declarou que nunca fora socialista. Depois, criou o Poste.
O Poste levou o país a um beco do qual agora imagina sair recorrendo a
executivos e professores que antes demonizou como neoliberais.
Nenhuma ossatura
intelectual. Dia desses, no Facebook – esse pátio virtual dos horrores – alguém
denunciou corrupção do adversário com ares de triunfo: “O PSDB também rouba!” E
alguém contra-atacou: “Vai pra Cuba!”
Minha mãe, mulher
sábia, diria: é o roto desfazendo do esfarrapado.
Minha mãe tinha
ossatura intelectual.
Muito bom!
ResponderExcluir