terça-feira, 4 de agosto de 2015

Autoritarismo à brasileira (do Marechal à presidente)







O autoritarismo é endêmico no Brasil, embora nem sempre seja explícito. Tivemos o autoritarismo do início da República, onde o Marechal Floriano Peixoto se destaca como tirano mandão, capaz de tomar a Ilha do Desterro, fuzilar seus líderes e impor à cidade um nome em sua própria homenagem. Mas Floriano não poderia prever que o nome Desterro fosse mantido até hoje pelos nativos e moradores da ilha. Ou prever que o povo criaria um novo nome para ela: Floripa. Feminino. Longe de lembrar o homem de ferro machão que o Marechal pensava ser.
Tivemos outro período de explícita ditadura, a de Vargas. À direita e à esquerda há quem lembre que Getúlio fez inovações. Verdade. Mas esquecem que ele é cria e herdeiro de um tirano gaúcho, Borges de Medeiros, positivista, centralizador, capaz de rasteiras espetaculares no povo e em adversários. Getúlio era ambíguo, malandro, namorou com o fascismo e o nazismo enquanto pode, chantageou os aliados e só quando viu a canoa ameaçada e avaliou as vantagens, se aliou aos inimigos do Eixo. Mandou pracinhas lutarem em seu lugar nas terras da Europa.
Um terceiro momento foi inaugurado em 1964 – e nem todos hoje lembram o que significou. Alguns alardeiam o progresso do país no período, sempre esquecendo as obras inacabadas, a destruição das instituições democráticas, as mortes e perseguições, os exílios políticos internos e externos. O autoritarismo dos militares tem vários nomes e dois ícones: Geisel e Figueiredo – que, aliás, foi humilhado em Floripa. Valentão de anedota, tentou partir para a porrada contra o povo na praça XV. Se deu mal.
Hoje, assombrados com a corrupção gerada nos governos petistas, alguns direitistas dizem que com os militares no poder não havia corrupção. Mentira. Um ministro era conhecido, inclusive internacionalmente, como “aquele dos 10%”.  Outro, que posava de empreendedor, seria hoje um prato cheio para o Juiz Sérgio Moro.
Acrescente-se outro traço dos políticos brasileiros: o apego desesperado ao poder. Prova disso é que político brasileiro não renuncia. Alguém poderia lembrar que dois renunciaram: Jânio e Collor. Ora, Jânio não renunciou. Ele armou uma farsa que pretendia ser um trampolim para voltar ao poder nos braços do povo. O povo lhe devolveu uma banana. E Collor não renunciou: deixou um bilhete e saiu pela porta da frente, disparando olhares selvagens, porque sabia que, mais um dia, sairia pela porta dos fundos.
Hoje vivemos um momento tenebroso de nossa história. Temos uma presidente que sempre se apresentou como gerente, técnica e durona, mas que se revelou exatamente o contrário. Gerenciou mal (a Petrobrás que o diga), não tem nenhuma qualificação técnica notável (enfiou o país numa crise financeira e social medonha) e nem mesmo é durona (já não manda nem no próprio mandato). Dilma é joguete de políticos do naipe de Eduardo Cunha, de fantasmas no armário como Lula, de empresários e políticos que podem incluí-la numa delação premiada junto com o seu mentor. Goza de míseros 6% de aprovação.
 No entanto, acena com seus quatro anos de mandato conquistados nas urnas. É verdade, é um mandato conquistado legitimamente nas urnas. Mas há um porém. Sempre há um porém. O mandato presidencial, em qualquer país decente do mundo, não é cheque em branco que permita a seu portador fazer o que bem entende. Assim como é recebido, pode ser perdido. Perdido pelos desmandos administrativos e políticos, pelas roubalheiras suas ou de seus comparsas, pela avaliação popular (e democrática) dos eleitores.
Mas aqui não é assim. A presidente se comporta como se fosse proprietária de um mandato digno de um Papa, cujo poder é garantido até a morte.
Para que lembrar tudo isso? Ora, em qualquer país democrático a pressão popular seria tamanha que seus poderes já teriam sido retirados. E num país no qual os governantes guardassem um mínimo de respeito pela vontade do povo, ela já teria – e seria um último gesto de grandeza que lhe sobraria – renunciado ao cargo, que leva adiante como um circo mambembe. Vive escondida, exibindo-se só para públicos domesticados, inaugurando obras inacabadas, promovendo reuniões nas quais mendiga – ela, a mandona – apoio e diálogo.
Quem tanto esbravejava, colocando o dedo no nariz de todos, hoje mendiga.
É algo sobre o que se deveria refletir.








Um comentário:

  1. Tudo muito bem colocado, caro Roberto. Divergimos um pouco quanto à questão dos militares, exceto sobre o Figueiredo, que pelo lado folclórico e pelas mancadas históricas seria um Lula com estudo e profundo conhecer de álgebra (óbvio que o Lula nem sabe o que é isso). Considero-me um filhotinho da ditadura, mas sem desconhecer alguns dos seus malefícios, elegendo como o principal sua longa duração. Não era para ser assim. Desse modo, não haveria um Figueiredo. Mas isso já é uma outra história. Abraço.

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