Afinal
estamos em 2017.
No
começo a gente custa a se habituar. Aquele 17 parece um equívoco. Experimente
preencher um cheque para ver. A grande vantagem é que ninguém mais preenche
cheques.
Em
todos os casos, estamos em 2017.
Confesso
que sofro muito com a passagem de ano. A cada 31 de dezembro preciso me
preparar espiritualmente para enfrentar aqueles vinte minutos de foguetório. Eu
e todos os cachorros da vizinhança entramos em pânico. Eles ao menos podem
latir. Eu coloco algodão nos ouvidos e fico quieto, vendo alguma bobagem na TV
ou lendo algum livro. Vinte minutos passam rápido, tento me consolar, mas sei
que não é verdade. Duram uma eternidade.
O
fato é que eu me pergunto por qual razão os seres humanos têm necessidade de barulho
para fingir que estão felizes. Para minha surpresa, de uns anos para cá tenho
ouvido foguetório também no Natal. O que terá o Natal com foguetório? Alguém
sabe?
Eu
não sei.
E
me vem a pergunta: o que há no barulho que não há no silêncio?
Agora,
em função da crise, o tempo de foguetório foi diminuído em alguns minutos. Não notei
muita diferença. Acho que poderiam soltar fogos de artifício, desses que só
fazem desenhos e grafites no céu. Faria sentido. Mas tiroteio? Para que
barulheira?
Os
cães aqui da vizinhança, que latem enquanto eu digo alguns palavrões, sofrem
muito. Eu tive um cachorro husky, chamado Nasco, que era meu alter-ego canino.
Ele tinha uma qualidade invejável: não obedecia a ninguém e não temia coisa
alguma, nem fiação elétrica, com o que levou vários choques.
Pois
o Nasco, animal tão nobre, tão belo, de inquietantes olhos azuis, forte,
corajoso, entrava em pânico com o foguetório. Agitava-se, corria pelo quintal,
enfiava-se num canto, junto com a Aika, sua namorada. Os dois sofriam muito e nada
os acalmava. Eram os 20 minutos mais longos de nossas vidas.
Quando
o foguetório acabava, estávamos exaustos.
Eis
porque eu e os cães sofremos muito nos finais de ano. No Natal tenho que
suportar o Papai Noel. Admiro o aniversariante do dia, Cristo, mas não entendo quem
inventou que essa figura gorducha, de riso caricatural, um consumista perverso,
deveria ocupar o lugar central no Natal.
A
festa não é religiosa? Cristo não é o homenageado?
O
comércio agradece.
Darci
Ribeiro dizia que seu sonho era ser Imperador do Brasil. Colocaria o país nos
eixos. Pois eu, caso assumisse algum cargo de dirigente do mundo, acabaria com
foguetórios. No lugar deles, poderíamos organizar gargalhadas coletivas, por
exemplo. Canto coral à beira mar. Palmas ao anoitecer. Aproveitaríamos a
ocasião para pedir, ai de nós, perdão pelos nossos pecadilhos, nossas culpas e eventual
desânimo em viver. Eu pediria desculpas pelo mau-humor que me ataca nessas
festas de fim de ano.
Trocaria
tudo isso por um cálice de vinho, a leitura de alguns poemas, boa música, um
sono quieto e alguém ao alcance da mão que eu pudesse acalmar caso algum
infeliz soltasse foguetes nas redondezas.
Ah,
sim, a passagem de ano seria comemorada com cinco minutos do mais absoluto e
sagrado silêncio.
Que
2017 nos seja leve.
Muito interessante. Ao invés da gestação, da comilança e bebedeiras, a busca da paz, da mudanca interior, uma pequena seia familiar na qual aproveitariamos para saciar a fome e a sede físicas e espirituais de mais alguém, encjendo-nos do prazer da solidariedade. Então, seriam BOAS AS FESTAS.
ResponderExcluirLindas paravras😊☝👏👏👏👏
ResponderExcluirGostei da ideia de gargalhadas coletivas. Muito bom!!!
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