Será Bolsonaro um enigma? Uma
farsa? Um truque rasteiro? Um gato escondido com o rabo de fora? Um pesadelo?
Um castigo para um país que não soube se construir com inteligência e dignidade?
Uma coisa é certa: mito é algo
que ele não é.
Todos os que se debruçam sobre
esses meses de desgoverno do Jair fazem esforços para entendê-lo segundo os
mais diversos modelos teóricos. Nenhum serve. Não há, nos mais diversos matizes
ideológicos ou científicos, quem os possa socorrer. De nada servem Adam Smith,
Conte, Weber, Marx. Não há o que dê conta da extravagância.
Pois eu, modesto escriba, quero
colaborar nessa corrida decifratória do Jair.
Considerados alguns fatos, tais
como, o caráter errático das opiniões e das decisões e decretos do Jair, analisados
os seus seguidos desmentidos de si mesmo, podemos dizer que essas idas e vindas
dele traçam um perfil de um jogo de pebolim: é uma esfera rodando sem destino ou
lógica, sem ordem ou nexo.
Vejamos. O afoito paraquedista já
desferiu golpes para todos os lados, sendo que todos eles estavam errados.
Um exemplo foi a questão da
liberação quase universal do porte e posse de armas, que seria a medida
certeira para exterminar com a criminalidade. O Brasil, é claro, viraria um
imenso território atravessado por balas perdidas de todos os lados. Mas seria,
na versão do Jair, um território mergulhado na paz. A paz feita de guerra. Bandidos
munidos de metralhadoras e fuzis se assustariam com o pacífico cidadão com um
trinta e oito na cintura. Essa medida foi anunciada aos arrancos, como é típico
do Jair, desde a campanha eleitoral, e teve um destino inglório: foi soterrada
por críticas vindas de todos os lados e, sobretudo, pela derrota mais
humilhante para quem dispõe de tantos assessores: o soberbo decreto era uma
enfiada de agressões à constituição. Ponto final. Foi quando o Jair foi
obrigado a mostrar a sua outra fase: disse que não era bem assim, era assado,
desconversou.
Outra bobagem: querer transformar
Angra dos Reis numa Cancun. A fúria com que esse indivíduo se arremessa contra
diversos sítios e símbolos nacionais, só seria superado pelas bobagens ditas a respeito
da Amazônia. Pretendeu convocar o presidente francês, Macron, para sobrevoar a
selva e, caso encontrasse sinais de devastação, ele se renderia. Nesse caso,
dado o disparate, ele se corrigiu de imediato sem dar ao Macron a chance de
aceitar ou não o convite.
Não demorou, arremeteu contra
Fernando de Noronha. O problema, no caso, seria o preço cobrado pelo ingresso
na ilha, coisa de cento e tantos reais para brasileiros. Ora, não é muito,
convenhamos, sendo que os custos de ir à Fernando de Noronha são outros:
deslocamento dentro do Brasil, hospedagem, passagem para a ilha, aonde se chega
somente por avião etc. Jair, golpeado por pancadaria grossa, deixou a ilha em
paz e trocou de alvo.
Ora, tudo isso indica que não há
princípio nem teoria alguma que oriente esse desorientado. Como seu universo
intelectual é bastante limitado, ele procede como se estivesse num Reality
Show. É o BBB - Big Brother Bolsonaro. Política, para ele, se funda no
seguinte: é preciso manter os adversários ocupados discutindo absurdos para que
o debate seguinte encubra o fato de que o governante não está fazendo nada.
Essa é a base das “ideias” do Jair.
O Reality Show se resume nisso: um bando de jovens de poucos miolos tentando
trapacear a tempo todo para derrubar os outros e se manter em cena.
O segundo tem a ver com as raízes
de Jair: a caserna. Estou convencido que ele vai demorar muito tempo para
entender que dirigir uma nação é algo muito mais complexo do que dar ordens a
um batalhão. Batalhão é algo uniforme e submisso: dessa experiência Jair
guardou o ríctus facial rígido e o queixo de boneco de ventríloquo.
Outras “ideias” do Jair,
certamente geradas no núcleo familiar, têm a ver com visões delirantes e
corrompidas da sexualidade e do pensamento, tal como a luta contra a suposta
doutrinação para que todos os jovens se tornem homossexuais –- um absurdo total
– somado a outra estupidez, a escola sem partido. Jair (e adversários, neste
caso) não entendeu que não existe escola com ou sem partido. Escola implica
livre troca de informações, de criação, de alternativas, é lugar de
aprendizagem, de debate, de dúvidas, de múltiplos pontos de vista, sendo que
partido é isso: partido. Algo fraturado. Assim, a ideia de educação é avessa à
ideia de doutrinação, seja de direita ou de esquerda. Um doutrinador é o oposto
de um educador.
Mas mentes obtusas amam simplificações,
tal como a bobagem de que meninos vestem azul e, meninas, rosa.
Tudo isso veio desaguar no
anúncio espalhafatoso da possível nomeação de seu filho, Eduardo, como embaixador
do Brasil nos EUA. Trata-se de um delírio chocante, que mesmo os mais toscos
ditadores evitaram. Pois Jair, em pleno delírio exaltado, veio a público defender
que nomear parentes para cargos públicos não é nepotismo. Seria o que, então?
Segundo Jair, uma forma de ajudar seu filho, bom rapaz, o que é natural num pai
dedicado. Nepotismo, portanto.
Ora, o que move um homem como
Jair? Trata-se de uma fúria desenfreada que imagina que a política é uma arena
para confrontos no estilo Reality Shows. É preciso trapacear, levantar
“polêmicas”, reunir agregados e comparsas, confrontar com inimigos a custa de
um vale tudo em busca do prêmio no final da carnificina.
O problema do Jair é que uma
nação não é um batalhão. Política não é apenas destroçar o adversário. O Brasil
não é um programa de TV. Para governar é preciso ter ideias, apresentar
soluções, encaminhar propostas viáveis, discutir com todo o conjunto da
sociedade para encontrar o melhor caminho para alcançar um patamar mais justo,
ser capaz de ouvir muitas vozes e opiniões e retirar disso tudo uma linha
mestra que possa unificar a nação em torno de objetivos que correspondam ao maior
benefício. Exige mente lúcida e generosa.
Nada disso está presente no
horizonte do Jair.
Até esse momento ele não
apresentou uma só ideia para a educação. Pensem bem: o que foi proposto para
educação exceto roupas azuis e rosas? Menos ainda ideias para a saúde, sendo
que se ignora o que o Jair deseja fazer para consertar o sistema de saúde no
Brasil, assim como inexistem projetos de como reformar o sistema viário
brasileiro – nenhuma meta colocada na mesa pelo governo. Além disso, expandir
exportações não se faz com nomeação de filho como embaixador.
A única ideia-milagre parida pelo
seu governo veio não dele, mas do ministro da Economia, Paulo Guedes,
que alias não fez mais do que por em prática a cartilha liberal. Mas todos
sabemos que milagres são coisas raras e não costumam salvar governos incompetentes.
O fracasso do Jair como
presidente é claro quando se avalia o que foi feito nesses meses de desgoverno.
Nada foi feito. O tempo foi perdido em “polêmicas” falsas que têm como objetivo
apenas esconder a incompetência, que não é apenas dele, Jair, mas de todo um
grupo de alucinados que o rodeiam e que se isolam cada vez mais. No entanto
eles jogam para a plateia, buscando manter cativo o percentual de votantes das
eleições.
Como cereja no bolo, Jair desferiu
sua mais recente trapalhada, agora contra o Instituto Nacional de Pesquisas
Espaciais. Em entrevista à imprensa, o presidente questionou os dados
fornecidos por aquele órgão sobre as taxas de desmatamento da Amazônia e disse
que são mentirosos, acusação que o diretor do INPE classificou de “conversa de
botequim”.
Assim, é com profunda tristeza
que devo sublinhar que, depois de sofrer com a grande derrocada do PT, que
jogou por terra uma chance histórica única, temos agora que suportar essa farsa
direitista cujas garras da brutalidade ainda estão por ser exibidas.
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