terça-feira, 23 de julho de 2019

O Big Brother Bolsonaro


 

Será Bolsonaro um enigma? Uma farsa? Um truque rasteiro? Um gato escondido com o rabo de fora? Um pesadelo? Um castigo para um país que não soube se construir com inteligência e dignidade?
Uma coisa é certa: mito é algo que ele não é.
Todos os que se debruçam sobre esses meses de desgoverno do Jair fazem esforços para entendê-lo segundo os mais diversos modelos teóricos. Nenhum serve. Não há, nos mais diversos matizes ideológicos ou científicos, quem os possa socorrer. De nada servem Adam Smith, Conte, Weber, Marx. Não há o que dê conta da extravagância.
Pois eu, modesto escriba, quero colaborar nessa corrida decifratória do Jair.
Considerados alguns fatos, tais como, o caráter errático das opiniões e das decisões e decretos do Jair, analisados os seus seguidos desmentidos de si mesmo, podemos dizer que essas idas e vindas dele traçam um perfil de um jogo de pebolim: é uma esfera rodando sem destino ou lógica, sem ordem ou nexo.
Vejamos. O afoito paraquedista já desferiu golpes para todos os lados, sendo que todos eles estavam errados.
Um exemplo foi a questão da liberação quase universal do porte e posse de armas, que seria a medida certeira para exterminar com a criminalidade. O Brasil, é claro, viraria um imenso território atravessado por balas perdidas de todos os lados. Mas seria, na versão do Jair, um território mergulhado na paz. A paz feita de guerra. Bandidos munidos de metralhadoras e fuzis se assustariam com o pacífico cidadão com um trinta e oito na cintura. Essa medida foi anunciada aos arrancos, como é típico do Jair, desde a campanha eleitoral, e teve um destino inglório: foi soterrada por críticas vindas de todos os lados e, sobretudo, pela derrota mais humilhante para quem dispõe de tantos assessores: o soberbo decreto era uma enfiada de agressões à constituição. Ponto final. Foi quando o Jair foi obrigado a mostrar a sua outra fase: disse que não era bem assim, era assado, desconversou.
Outra bobagem: querer transformar Angra dos Reis numa Cancun. A fúria com que esse indivíduo se arremessa contra diversos sítios e símbolos nacionais, só seria superado pelas bobagens ditas a respeito da Amazônia. Pretendeu convocar o presidente francês, Macron, para sobrevoar a selva e, caso encontrasse sinais de devastação, ele se renderia. Nesse caso, dado o disparate, ele se corrigiu de imediato sem dar ao Macron a chance de aceitar ou não o convite.
Não demorou, arremeteu contra Fernando de Noronha. O problema, no caso, seria o preço cobrado pelo ingresso na ilha, coisa de cento e tantos reais para brasileiros. Ora, não é muito, convenhamos, sendo que os custos de ir à Fernando de Noronha são outros: deslocamento dentro do Brasil, hospedagem, passagem para a ilha, aonde se chega somente por avião etc. Jair, golpeado por pancadaria grossa, deixou a ilha em paz e trocou de alvo.
Ora, tudo isso indica que não há princípio nem teoria alguma que oriente esse desorientado. Como seu universo intelectual é bastante limitado, ele procede como se estivesse num Reality Show. É o BBB - Big Brother Bolsonaro. Política, para ele, se funda no seguinte: é preciso manter os adversários ocupados discutindo absurdos para que o debate seguinte encubra o fato de que o governante não está fazendo nada.
Essa é a base das “ideias” do Jair. O Reality Show se resume nisso: um bando de jovens de poucos miolos tentando trapacear a tempo todo para derrubar os outros e se manter em cena.
O segundo tem a ver com as raízes de Jair: a caserna. Estou convencido que ele vai demorar muito tempo para entender que dirigir uma nação é algo muito mais complexo do que dar ordens a um batalhão. Batalhão é algo uniforme e submisso: dessa experiência Jair guardou o ríctus facial rígido e o queixo de boneco de ventríloquo.
Outras “ideias” do Jair, certamente geradas no núcleo familiar, têm a ver com visões delirantes e corrompidas da sexualidade e do pensamento, tal como a luta contra a suposta doutrinação para que todos os jovens se tornem homossexuais –- um absurdo total – somado a outra estupidez, a escola sem partido. Jair (e adversários, neste caso) não entendeu que não existe escola com ou sem partido. Escola implica livre troca de informações, de criação, de alternativas, é lugar de aprendizagem, de debate, de dúvidas, de múltiplos pontos de vista, sendo que partido é isso: partido. Algo fraturado. Assim, a ideia de educação é avessa à ideia de doutrinação, seja de direita ou de esquerda. Um doutrinador é o oposto de um educador.
Mas mentes obtusas amam simplificações, tal como a bobagem de que meninos vestem azul e, meninas, rosa.
Tudo isso veio desaguar no anúncio espalhafatoso da possível nomeação de seu filho, Eduardo, como embaixador do Brasil nos EUA. Trata-se de um delírio chocante, que mesmo os mais toscos ditadores evitaram. Pois Jair, em pleno delírio exaltado, veio a público defender que nomear parentes para cargos públicos não é nepotismo. Seria o que, então? Segundo Jair, uma forma de ajudar seu filho, bom rapaz, o que é natural num pai dedicado. Nepotismo, portanto.
Ora, o que move um homem como Jair? Trata-se de uma fúria desenfreada que imagina que a política é uma arena para confrontos no estilo Reality Shows. É preciso trapacear, levantar “polêmicas”, reunir agregados e comparsas, confrontar com inimigos a custa de um vale tudo em busca do prêmio no final da carnificina.
O problema do Jair é que uma nação não é um batalhão. Política não é apenas destroçar o adversário. O Brasil não é um programa de TV. Para governar é preciso ter ideias, apresentar soluções, encaminhar propostas viáveis, discutir com todo o conjunto da sociedade para encontrar o melhor caminho para alcançar um patamar mais justo, ser capaz de ouvir muitas vozes e opiniões e retirar disso tudo uma linha mestra que possa unificar a nação em torno de objetivos que correspondam ao maior benefício. Exige mente lúcida e generosa.
Nada disso está presente no horizonte do Jair.
Até esse momento ele não apresentou uma só ideia para a educação. Pensem bem: o que foi proposto para educação exceto roupas azuis e rosas? Menos ainda ideias para a saúde, sendo que se ignora o que o Jair deseja fazer para consertar o sistema de saúde no Brasil, assim como inexistem projetos de como reformar o sistema viário brasileiro – nenhuma meta colocada na mesa pelo governo. Além disso, expandir exportações não se faz com nomeação de filho como embaixador.
A única ideia-milagre parida pelo seu governo veio não dele, mas do ministro da Economia, Paulo Guedes, que alias não fez mais do que por em prática a cartilha liberal. Mas todos sabemos que milagres são coisas raras e não costumam salvar governos incompetentes.
O fracasso do Jair como presidente é claro quando se avalia o que foi feito nesses meses de desgoverno. Nada foi feito. O tempo foi perdido em “polêmicas” falsas que têm como objetivo apenas esconder a incompetência, que não é apenas dele, Jair, mas de todo um grupo de alucinados que o rodeiam e que se isolam cada vez mais. No entanto eles jogam para a plateia, buscando manter cativo o percentual de votantes das eleições.
Como cereja no bolo, Jair desferiu sua mais recente trapalhada, agora contra o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais. Em entrevista à imprensa, o presidente questionou os dados fornecidos por aquele órgão sobre as taxas de desmatamento da Amazônia e disse que são mentirosos, acusação que o diretor do INPE classificou de “conversa de botequim”.
Assim, é com profunda tristeza que devo sublinhar que, depois de sofrer com a grande derrocada do PT, que jogou por terra uma chance histórica única, temos agora que suportar essa farsa direitista cujas garras da brutalidade ainda estão por ser exibidas.

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