Conta-se que certa vez um
filósofo disse a um aluno tido como muito estudioso e obediente:
- Observe.
O aluno se colocou em
postura de observador, rastreou as redondezas com um olhar de investigação, e
ficou assim por algum tempo, estático e perplexo, até que superou o medo de
fazer a pergunta que lhe perturbava a mente:
- Observar o quê,
senhor?
O filósofo aplaudiu:
- Muito bem, é preciso
ter algo a observar.
- Sim, senhor. Mas, há
tantas coisas a minha volta – o aluno percorreu com um gesto o campo em frente,
vários grupos de árvores, uma casa modesta, um riachinho que passava ao fundo
do vale, animais pastando.
- O que lhe falta,
então? – perguntou o filósofo.
- É preciso escolher
entre tantas coisas.
- Pois então observe
aquela árvore.
Empolgado, o aluno
mirou na árvore um olhar penetrante e a percorreu de cima a baixo com todo o
seu poder de observação.
Mas, passados alguns
minutos, lá estava o aluno embaraçado novamente.
- O que houve?
perguntou o filósofo.
- Perdão, senhor.
Mas... o que devo observar na árvore? – e passou a enumerar, movido por intensa
aflição – Essa árvore é alta, frondosa, tem folhas muito verdes, não tem
frutos, o tronco é escuro, as raízes não são aparentes. Mas...
O filósofo esperou,
pensativo e irônico como os filósofos dos quais se contam causos do gênero.
- Mas... – provocou
ele, divertindo-se com a aflição do aluno.
- Não basta, senhor.
Tenho a árvore, sei que devo observá-la, mas... O que escolho nessa multidão de
coisas? Mesmo numa só árvore há uma multidão de coisas, senhor.
- Ah, muito
interessante. Há que fazer uma...
- ...nova escolha,
vibrou o aluno.
- Ótimo. E agora?
- Bom, uma árvore é um
ser vivo. Algumas dão frutos. Pessoas se alimentam deles. Precisam de água, de
sol – mas não em excesso, há um limite. Com sol demais, secam. Com água demais,
murcham. Depois, um dia foram sementes, brotaram... Ah, senhor, é muita coisa.
Não sei mais o que pensar.
- Talvez seja
necessário uma nova escolha, sugeriu o filósofo.
- Como?
- Bom, quem está
observando é você...
O embaraço do aluno
cresceu. Não conseguiu entender porque era tão importante o fato de que ele, e
não outro, estivesse observando a árvore.
- Já sei! – exclamou
afinal – Não basta a árvore, é preciso o meu olhar. Pois é certo que meu olhar modifica
o que vejo. Cada um vê a seu modo, de um certo ângulo.
- É, murmurou o
filósofo.
Então os dois ficaram
em silêncio. O filósofo, com um sorriso divertido, aguardando o próximo passo.
O aluno, aflito, tentando entender o que lhe passava pela cabeça.
- Bom – suspirou o
aluno – como sou, além de seu aluno, um filho de agricultores, acho que a
árvore deveria ser vista como produtora de algo, alimento ou madeira.
- Outros – aproveitou o
filósofo – poderiam ver nela uma manifestação vital, uma fonte de energia, um
lugar de trocas entre um organismo, a água, o sol. Talvez um símbolo. Talvez
apenas beleza.
- Mas... isso não acaba
nunca, senhor, as combinações são infinitas. Há uma quantidade imensa de perguntas
a fazer.
Nesse momento, feliz e sem
ironia nos lábios, o filósofo sorriu.
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