Mergulhados no clima da
Copa, me ocorre um tema óbvio: futebol. Não o profissional, mas aquele que
praticávamos em mesas, com botões, ou em campos de terra, com nossas pernas.
Os botões exigiam
trabalho e destreza. Primeiro, roubar botões dos casacos dos pais, encontrar um
ponta de lança ideal no fundo de uma gaveta, esmerilhar no cimento molhado as
bordas de um botão mais leve para ser o artilheiro.
Polidos os craques,
faltava o goleiro. Goleiro é bicho diferente. Uma caixa de fósforos cheia de
chumbo. Vinham então os nomes. Gilmar, Zizinho, Nilton Santos, Didi, Dida, Ademir
da Guia, Pepe, Coutinho. E Pelé e Garrincha, claro.
Botões próprios para
cada posição. Nutríamos desprezo olímpico pelos jogos comprados em lojas. Revirávamos
gavetas e armários em busca do botão com jeito de centroavante ou zagueiro
central – robustos e altos – e botões dribladores, leves, capazes de tiros em
diagonal.
Foi quando pensei que,
fosse hoje escalar um time de botão, homenagearia companheiros de futebol de
pelada.
Foram muitos, escolho
alguns. Começou na remota Blumenau. No gol, o Tati. Um italiano baixo e
gordote. Mas pegava bem e seu nome estaria na caixa de fósforos. Na zaga não
sei quem colocaria. Zagueiros a gente esquece fácil. No meio de campo e no
ataque, diversos craques e outros nem tanto, onde me incluo.
Um deles é Carlos
Augusto de Souza, com o hábito enervante de jogar sorrindo e de driblar mostrando
a dentadura. Um debochado. Depois, Gastão Câmara. Pequenino, feliz da vida. Dono
do campinho ao lado de sua casa. Talentoso, tirava nota máxima em todas as provas
e estudava violino. Então, havendo aula de violino, não havia jogo. Ficávamos
no meio fio, acabrunhados, o campinho deserto, enquanto Gastão arranhava as
cordas do violino, que escutávamos como quem ouve uma canção de lamento.
Carlos Augusto e Gastão
são hoje pediatras de primeira linha. Craques.
Um botão ágil e malandro
seria Vinicius Fiamoncini, que se tornou delegado de polícia, o que teria
serventia havendo desordem durante as partidas. E o mais temível de todos:
Mauro Longo. Um craque de verdade. Chegou a jogar profissionalmente e era capaz
de driblar todo mundo, voltar, driblar de novo. Só para humilhar.
Como centroavante, um
alemão decidido que dava patadas em todas as direções, não raro no gol: Carlos
Wiederhker. Destroçava zagueiros e vivia com as canelas esfoladas.
Em Curitiba, joguei com
um maestro, Cláudio Ruaro. Enervantemente calmo, milimetricamente preciso,
fazia todo o time girar em torno dele. Era bom ver o Cláudio jogar. E dois atacantes
rompedores: Vicente Ataíde, que, entre papos sobre literatura e piadas infames,
quebrou a clavícula em campo. Já Orlando Bogo corria feito um raio.
Mas me recuso a incluir
nessa lista um perna-de-pau metido a jogador. Alto, cabelos lisos, longos e loiros,
ego avantajado. Famoso por ter marcado um gol sem querer. Ajeitava a vasta cabeleira
ao baterem um corner. Levou a bola no cocuruto e ela entrou no gol. Não se deu
por achado. Comemorou eufórico seu feito.
Enfim, futebol de botão
e de pelada. Coisas boas da vida.
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