terça-feira, 22 de julho de 2014

Um desastrado motorista de fogão


 


Confesso: me fascina gente que sabe cozinhar.
Lembro-me de minha mãe, hábil com os temperos, o ponto das carnes, a consistência do macarrão e o sabor exato do café. Fazia café delicioso. Quando menino, eu ia ao armazém comprar café moído na hora, uma de suas manias. Coador de pano, o cheiro do café tomava conta da casa. Eis o maior dos meus fascínios: fosse para fazer café só para mim ou para uma sala cheia de visitas, ela não errava. Acertava, sem medidas complicadas, apenas no olho, a quantidade de pó e de água. O resultado era perfeito. Até hoje me parece um prodígio.
O mesmo ela fazia como costureira. Bastava olhar para uma foto que alguma cliente trazia e ela já sabia como seria o corte, as medidas, e a tal da cava – palavrinha que me deixava atônito. Que seria uma cava? Nada de modelos e de riscados complicados. Media daqui e dali e estava pronta para empunhar a tesoura.
Mas eu falava de cozinheiros e de pilotagem de fogão.
Pois assisto a programas de receitas culinárias. Fico fascinado. E o fascínio vem do seguinte: não entendo nada. Falam de temperos, de marinar, de deixar reservado, de levantar ou baixar o fogo quando chegar ao ponto de fervura etc. Não entendo, mas assisto.
Por exemplo. Ensaio fazer arroz. Preciso de receita. Aliás, sigo receita até para fazer miojo. Marco o tempo de três minutos no despertador do celular. Sei lá qual é a duração de três minutos!
Lá pelas tantas, a receita decreta: coloque o sal. Dia desses, esqueci o sal. Resolvi colocar já com o arroz quase pronto e, por algum mistério, o sal não pegava. Coloquei mais. Nada. Mais um pouco. Notei então que o arroz, além de não ficar salgado, estava ficando escuro, marrom. Havia colocado açúcar. Pote errado.
Aliás, essa é uma indicação que me deixa aflito: coloque sal a gosto.
Que diabos significa sal a gosto?
Sou capaz de saber se uma comida está com sal a gosto só depois de pronta. Antes, impossível. Vai daí, erro sempre. Mas tenho agora seguido um conselho sábio que me deram: coloque pouco. Com a comida já pronta, é possível colocar mais sal. Retirar o excesso é impossível. Eis a máxima que sigo.
Mas realizo progressos.
Tirar pele de tomate, por exemplo. Antes eu esfolava o tomate furiosamente, arrancava lascas do coitado numa batalha sangrenta e desigual. Ao final, sobrava meio tomate, sendo que a receita exigia um tomate de tamanho médio. E lá vinha nova aflição: o que é um tomate de tamanho médio?
Agora aprendi – com o deus de todas as informações, o Google – que basta aquecer o tomate. A pele sai fácil. Ao realizar essa proeza me sinto um maître.
Escrevi tudo isso para distrair a manhã de domingo dos leitores com algumas abobrinhas – sou nisso um cozinheiro razoável – e confessar que, tendo colocado o óleo, refogado cebola e alho, picado tomate sem sementes e pele, usado sal e não açúcar no arroz, fui dar uma olhada na televisão e, quando voltei, havia na cozinha uma infernal nuvem negra, um borbulhar dantesco de fervuras, águas esguichando e cheiro medonho de queimado no ar.
Desisti. Fui ao restaurante por quilo mais próximo.




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