Confesso: me fascina
gente que sabe cozinhar.
Lembro-me de minha mãe,
hábil com os temperos, o ponto das carnes, a consistência do macarrão e o sabor
exato do café. Fazia café delicioso. Quando menino, eu ia ao armazém comprar
café moído na hora, uma de suas manias. Coador de pano, o cheiro do café tomava
conta da casa. Eis o maior dos meus fascínios: fosse para fazer café só para
mim ou para uma sala cheia de visitas, ela não errava. Acertava, sem medidas
complicadas, apenas no olho, a quantidade de pó e de água. O resultado era perfeito.
Até hoje me parece um prodígio.
O mesmo ela fazia como
costureira. Bastava olhar para uma foto que alguma cliente trazia e ela já
sabia como seria o corte, as medidas, e a tal da cava – palavrinha que me
deixava atônito. Que seria uma cava? Nada de modelos e de riscados complicados.
Media daqui e dali e estava pronta para empunhar a tesoura.
Mas eu falava de
cozinheiros e de pilotagem de fogão.
Pois assisto a
programas de receitas culinárias. Fico fascinado. E o fascínio vem do seguinte:
não entendo nada. Falam de temperos, de marinar, de deixar reservado, de
levantar ou baixar o fogo quando chegar ao ponto de fervura etc. Não entendo,
mas assisto.
Por exemplo. Ensaio
fazer arroz. Preciso de receita. Aliás, sigo receita até para fazer miojo.
Marco o tempo de três minutos no despertador do celular. Sei lá qual é a
duração de três minutos!
Lá pelas tantas, a
receita decreta: coloque o sal. Dia desses, esqueci o sal. Resolvi colocar já
com o arroz quase pronto e, por algum mistério, o sal não pegava. Coloquei
mais. Nada. Mais um pouco. Notei então que o arroz, além de não ficar salgado,
estava ficando escuro, marrom. Havia colocado açúcar. Pote errado.
Aliás, essa é uma indicação
que me deixa aflito: coloque sal a gosto.
Que diabos significa
sal a gosto?
Sou capaz de saber se
uma comida está com sal a gosto só depois de pronta. Antes, impossível. Vai daí,
erro sempre. Mas tenho agora seguido um conselho sábio que me deram: coloque
pouco. Com a comida já pronta, é possível colocar mais sal. Retirar o excesso é
impossível. Eis a máxima que sigo.
Mas realizo progressos.
Tirar pele de tomate,
por exemplo. Antes eu esfolava o tomate furiosamente, arrancava lascas do
coitado numa batalha sangrenta e desigual. Ao final, sobrava meio tomate, sendo
que a receita exigia um tomate de tamanho médio. E lá vinha nova aflição: o que
é um tomate de tamanho médio?
Agora aprendi – com o
deus de todas as informações, o Google – que basta aquecer o tomate. A pele sai
fácil. Ao realizar essa proeza me sinto um maître.
Escrevi tudo isso para
distrair a manhã de domingo dos leitores com algumas abobrinhas – sou nisso um
cozinheiro razoável – e confessar que, tendo colocado o óleo, refogado cebola e
alho, picado tomate sem sementes e pele, usado sal e não açúcar no arroz, fui
dar uma olhada na televisão e, quando voltei, havia na cozinha uma infernal
nuvem negra, um borbulhar dantesco de fervuras, águas esguichando e cheiro
medonho de queimado no ar.
Desisti. Fui ao
restaurante por quilo mais próximo.
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