Mário na rede, 1929, Lasar Segall |
Os
jornalões e jornalinhos andam assanhados. Foi revelada carta de Mário de
Andrade falando de sua homossexualidade.
Eu
fico pensando: e daí?
Só
não sabia ou desconfiava da homossexualidade de Mário quem nunca leu seus
livros e poemas, quem nunca pesquisou sua vida, quem nunca observou suas fotos ou
ouviu a sua voz gravada. Portanto, nada de novo.
Esses
espalhafatos dos chamados, na falta de outro nome, cadernos culturais, revelam
mais a respeito do que eles são do que sobre o que Mário foi. Esses cadernos,
bem como toda a “divulgação cultural” relacionada à literatura, estão mais
interessados em fofocas pessoais, em bisbilhotar sexualidades, badalação de escritores
da patota, lançamentos de livros, além de encher linguiça com as infindáveis e
comerciais Flaps, Fleps, Flips, Flops e Flups.
Desde
a morte de Wilson Martins desapareceu a crítica literária em jornais. Nada mais
resta nos tais cadernos além de entrevistas sobre o umbigo dos escritores e resenhas
recauchutadas fornecidas pelas editoras. Tudo pode ser notícia, menos o livro e
o que ele contém. Fala-se do lançamento, da tarde/noite de autógrafos, de
eventuais e duvidosos sucessos. Ou se gasta tempo e teclado com “50 tons”,
“Greys” e suas dezenas de imitações. É quando encontramos perguntas com a
profundidade de um pires: quando teve a ideia desse livro? Quanto tempo levou
escrevendo? Qual de seus livros é o preferido? Dá para viver só de literatura
no Brasil?
Pouco
antes de Dalton Trevisan – notável escritor, exemplo de sobriedade e de
honestidade intelectual – fazer noventa anos, reporteiros assanhados andaram
por Curitiba querendo entrevistá-lo. Dalton, é sabido, não dá entrevistas.
Correu com os chatos. Não contentes, os jornaleiros culturais saíram pela
cidade perguntando a todos que encontravam a respeito de coisas que imaginam
importantes em Dalton: tem namorada? É viciado? Bebe? É mesmo vampiro? Vai à
zona?
Como
se vê, perguntas profundamente culturais.
Os
curitibanos procurados pelos reporteiros mandaram que eles fossem chatear em
outra freguesia.
Sobre
a obra de Dalton, pouca coisa. Ou bobagens. Picuinhas. Notinhas ao pé da
página.
Pois
agora temos mais essa: a sexualidade de Mário de Andrade. Que importância tem
isso? Nenhuma. Eles, os jornaleiros, acham que rende comentários nas redes
sociais. Agita o ambiente.
Não
é de estranhar. Estamos num país onde as voltinhas de bicicleta da presidente, sua
opinião sobre yoga e os quilos que perdeu fazendo dieta, são notícia. Enquanto navegamos
no alto de tsunamis que ameaçam engolir a todos nós, jornaleiros se prestam a
amaciar a “imagem” da presidente.
E
remexem cartas antigas querendo escandalizar e/o atrair bobocas e fuxiqueiros em
geral.
O
Dalton já advertiu há muito tempo: só importa a obra.
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