Frequentávamos o chamado
curso científico. Havia no currículo muita matemática, química e física. As
aulas de física eram puxadas, mas um professor nos surpreendeu ao aplicar a primeira
prova mensal. Antes de distribuir as questões, foi ao quadro-negro (era negro,
na época) e lá escreveu todas as fórmulas sobre cálculo de volumes, velocidade,
peso, aceleração que havíamos estudado.
Feito isso, distribuiu
as questões da prova e explicou que no quadro estavam fórmulas que poderíamos aplicar
na solução dos problemas. Nada de decoreba.
- A memória foi feita
para guardar coisas agradáveis, decretou. O importante é raciocinar.
Lembro-me desse
professor sempre que penso nas provas de redação.
O tema é segredo total.
O aluno só irá conhecê-lo na hora da prova. Ora, sabemos que os escritores
jamais escrevem sobre assuntos que não dominam e pelos quais não têm interesse.
Vejamos o caso de um jornalista. Deve conhecer o assunto, precisa ler,
pesquisar, entrevistar, juntar informações. Caso contrário, sua técnica de
redator não funciona.
Em segundo lugar, me horroriza
a solidão absurda em que está o aluno. Ele, uma caneta, uma folha de papel.
Ora, escritores não escrevem assim.
Cito o meu caso por ser
o caso de todos. Escrevo usando um notebook. Sobre coisas que me interessam e
sobre as quais pesquisei em livros ou documentos. E conto com a presença de
dicionários e livros de consulta. E posso acionar a internet para consultar
enciclopédias, verificar datas, ortografia de nomes, nomes de lugares.
É com todos esses
recursos que escritores e jornalistas escrevem. É também com o apoio dessas
armas que professores e acadêmicos redigem teses e preparam aulas.
Já o aluno está abandonado
à própria sorte. Suando frio. Só pode recorrer à sua flagelada memória.
E tem mais. Essas
provas de redação se apegam, por mais que digam o contrário, a duas coisas
secundárias: ortografia e regras gramaticais. Como se isso fosse o mais importante
no domínio da escrita.
Hoje todos nós temos no
micro um corretor à disposição. Alerta para equívocos, sugere alternativas.
Todos usam isso, escritores, jornalistas, professores – menos os pobres alunos.
E tem mais. Muitas vezes,
diante de uma dúvida – digamos, uma crase impertinente – recorro a antigos
colegas de faculdade. Além disso, antes de ser publicado, um texto é submetido
ao crivo severo de um revisor. Revisores já me salvaram de publicar
barbaridades.
E o aluno? Está em
total abandono. Deve escrever sobre algo que não escolheu e que talvez nem seja
do seu interesse e sobre o que não teve tempo de pesquisar. Deve estar atento às
armadilhas ortográficas e gramaticais. Além disso, ser capaz de algum brilho ou
graça no texto.
Certo estava meu
professor de física. Fórmulas devem estar disponíveis no quadro. No caso da
redação, permitir o uso dicionários e obras de consulta.
Quem souber pensar, escreverá
uma boa redação.
Correto. Além do pensar e dicionário, uma das fórmulas inegáveis para uma boa redação e o desenvolvimento de qualquer texto é a bagagem de leitura que se tem, ou um acúmulo de fatos e saberes na memória que a melhor forma de expô-los é escrevendo.
ResponderExcluirConcordo com seus argumentos, caro Roberto. No entanto fiquei aqui me perguntando de que forma seria aplicada a prova de redação ideal. Trazer consigo o dicionário é uma medida simples e legítima, mas quanto ao tema acho que deverá continuar surpresa. Porque os estudantes de hoje tem um leque de possibilidades tão vasto que a tentação de copiar e colar seria um enorme problema, difícil de ser contornado. Levando em conta o exemplo do seu professor, talvez um bom caminho fosse a elaboração da redação com base num texto, assim como nos problemas de física, onde temos que primeiro decifrar o enunciado pra depois usar as fórmulas. Que tal?
ResponderExcluirMuito bom seu artigo. Todos os profissionais fazem consultas, conferem, validam suas produções com seus pares. Só o aluno não. O valor do conhecimento está em fazer as melhores escolhas. O bom é que o professor, em sala de aula, pode fazer isso diferente, para sorte de alguns alunos.
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