Laurinho Telefone é o
especialista em mulheres aqui na Vila, o que é atestado pelo número de
encrencas que contabiliza com o sexo feminino. Vários casamentos, namoricos de
diversa ordem, tentativas vãs de convivência, encontros furtivos e clandestinos,
de tudo ele coleciona – sendo que ao final, leva novos catiripapos em sua
atribulada vida amorosa.
Mas ele não tem
conserto. Agora, após novo e sonoro catiripapo que recebeu por esses dias,
Laurinho anda resmungando pelos cantos, sofrido e melancólico feito um poeta
romântico tuberculoso:
- As mulheres são assim
mesmo. É da ordem universal!
Pouca gente ainda dá
ouvidos a seus lamentos, mas o Cego Tião, dono do boteco e auditor por
profissão e destino, pergunta, só para deslanchar o papo:
- Assim como, Laurinho?
- Assim, ora. Assim
como elas são. Piscam, dão gingadas, se mostram, sorriem, insinuam, são
deliciosas, passam pertinho da gente e... – as mãos da Laurinho, também
conhecido pelas encenações mímicas, se perdem no ar.
Cego Tião, limpando o balcão
com um pano sujo, resmunga:
- ...e o quê, Laurinho?
- E somem. Fogem.
Desconversam.
Laurinho fez um
silêncio soturno e olhou longamente pela janela. Cego Tião, que talvez não seja
dado a essas sutilezas por não olhar através de janelas, cortou de bate pronto:
- Cê tá muito chorão.
Laurinho deu um salto
da cadeira, ameaçou disparar porta afora, mas achou melhor voltar e liquidar
com o resto de vodka em seu copo. Refeito com o gole da bebida, disparou na
direção de Tião:
- Ô sujeito insensível!
Tião, paciente, cruzou
os braços sobre o balcão e perguntou:
- Está bem, o que
aconteceu?
- Põe mais uma.
Dessa vez tinha sido a Nildinha,
começou Laurinho. Ficaram juntos, foram ao cinema, ao parque, ao bailão de
sábado. Três meses de rodeios, dois de amores e, súbito, ela encrencou. Não
queria mais saber dele.
- O que será que as
mulheres querem, Tião?
Lá no fundo do bar
ouviu-se a voz monótona e ébria do causídico da Vila, o dr. Pamphilo Assumpção Datavênia:
- Sabem que o Freud
perguntou a mesma coisa? O que querem as mulheres? Was will das Weib? – e
arrematou: Não encontrou resposta.
Os dois, ofendidos,
desprezaram a intervenção erudita do bêbado e retomaram a conversa:
- Casar. Eu te disse quando
você apareceu aqui com a Nildinha. É daquelas que casam. Te cuida.
Era verdade. O cego advertira.
Laurinho baixou a cabeça, mas reagiu:
- Pois agora chega!
Chega de mulher!
Foi dizer isso e entrou
bar adentro uma jovem metida num vestido curto, vermelho, sapatinho branco.
Laurinho levantou os olhos e conferiu o restante. Era esplendorosa.
- Que quer essa mulher?
perguntou Laurinho, muito cavalheiro.
Ela sorriu. Queria um
pacote de café e algumas balas.
- Deixa comigo, disse
Laurinho, pulando para trás do balcão. Apanhou o café, colocou as balas num
saquinho branco, entregou a ela com um sorriso: Uma nova moradora da Vila merece
um atendimento de primeira, declarou.
A moça sorriu. Laurinho
pensou: tá no papo.
- Mora aonde?
- Ao lado da farmácia.
- Pois eu estava indo
pra lá. Posso acompanhá-la?
Despediu-se de Tião ordenando
que colocasse a bebida e as compras da moça na sua conta.
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