segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Laurinho e as mulheres





Laurinho Telefone é o especialista em mulheres aqui na Vila, o que é atestado pelo número de encrencas que contabiliza com o sexo feminino. Vários casamentos, namoricos de diversa ordem, tentativas vãs de convivência, encontros furtivos e clandestinos, de tudo ele coleciona – sendo que ao final, leva novos catiripapos em sua atribulada vida amorosa.
Mas ele não tem conserto. Agora, após novo e sonoro catiripapo que recebeu por esses dias, Laurinho anda resmungando pelos cantos, sofrido e melancólico feito um poeta romântico tuberculoso:
- As mulheres são assim mesmo. É da ordem universal!
Pouca gente ainda dá ouvidos a seus lamentos, mas o Cego Tião, dono do boteco e auditor por profissão e destino, pergunta, só para deslanchar o papo:
- Assim como, Laurinho?
- Assim, ora. Assim como elas são. Piscam, dão gingadas, se mostram, sorriem, insinuam, são deliciosas, passam pertinho da gente e... – as mãos da Laurinho, também conhecido pelas encenações mímicas, se perdem no ar.
Cego Tião, limpando o balcão com um pano sujo, resmunga:
- ...e o quê, Laurinho?
- E somem. Fogem. Desconversam.
Laurinho fez um silêncio soturno e olhou longamente pela janela. Cego Tião, que talvez não seja dado a essas sutilezas por não olhar através de janelas, cortou de bate pronto:
- Cê tá muito chorão.
Laurinho deu um salto da cadeira, ameaçou disparar porta afora, mas achou melhor voltar e liquidar com o resto de vodka em seu copo. Refeito com o gole da bebida, disparou na direção de Tião:
- Ô sujeito insensível!
Tião, paciente, cruzou os braços sobre o balcão e perguntou:
- Está bem, o que aconteceu?
- Põe mais uma.
Dessa vez tinha sido a Nildinha, começou Laurinho. Ficaram juntos, foram ao cinema, ao parque, ao bailão de sábado. Três meses de rodeios, dois de amores e, súbito, ela encrencou. Não queria mais saber dele.
- O que será que as mulheres querem, Tião?
Lá no fundo do bar ouviu-se a voz monótona e ébria do causídico da Vila, o dr. Pamphilo Assumpção Datavênia:
- Sabem que o Freud perguntou a mesma coisa? O que querem as mulheres? Was will das Weib? – e arrematou: Não encontrou resposta.
Os dois, ofendidos, desprezaram a intervenção erudita do bêbado e retomaram a conversa:
- Casar. Eu te disse quando você apareceu aqui com a Nildinha. É daquelas que casam. Te cuida.
Era verdade. O cego advertira. Laurinho baixou a cabeça, mas reagiu:
- Pois agora chega! Chega de mulher!
Foi dizer isso e entrou bar adentro uma jovem metida num vestido curto, vermelho, sapatinho branco. Laurinho levantou os olhos e conferiu o restante. Era esplendorosa.
- Que quer essa mulher? perguntou Laurinho, muito cavalheiro.
Ela sorriu. Queria um pacote de café e algumas balas.
- Deixa comigo, disse Laurinho, pulando para trás do balcão. Apanhou o café, colocou as balas num saquinho branco, entregou a ela com um sorriso: Uma nova moradora da Vila merece um atendimento de primeira, declarou.
A moça sorriu. Laurinho pensou: tá no papo.
- Mora aonde?
- Ao lado da farmácia.
- Pois eu estava indo pra lá. Posso acompanhá-la?
Despediu-se de Tião ordenando que colocasse a bebida e as compras da moça na sua conta.



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