A Arena da Baixada fora
inaugurada há alguns meses e, naquele dia, fui com um amigo de São Paulo assistir
a um jogo; ele desejava conhecer o estádio. Ao sairmos, notei que ele olhava de
um lado para outro, em silêncio. Quando alcançamos a rua, comentou:
- Quem projetou esse
estádio apostou que nunca irá acontecer aqui uma situação de pânico.
Eu, ainda inebriado com
a nova Baixada, me dei conta então do óbvio. As saídas eram estreitas, as
escadas muito inclinadas e cheias de voltas e, na medida em que nos
aproximávamos da saída, a passarela se estreitava como um funil. Chegamos à rua
empurrados por uma multidão comprimida nas dimensões de um portão de garagem.
Houvesse um fogo às nossas costas...
Bom, estão reformando a Arena para a Copa;
espero que esses erros sejam corrigidos.
Foi disso que lembrei
quando ocorreu essa tragédia na boate de Santa Maria. O óbvio é o seguinte: os
erros dessas construções que se destinam a abrigar multidões costumam estar já
nos projetos.
Agora, duzentos e
trinta e tantos mortos depois, as chamadas autoridades se agitam, ameaçam tomar
providências, anunciam investigações, lamentam os mortos e feridos, comovem-se
com o sofrimento das famílias das vítimas.
Ocorre que agora é
tarde. O desastre está consumado.
As portas de emergência
deveriam estar no projeto – e deveriam ter sido executadas; os recursos contra
incêndio deveriam ter sido previstos. Saídas de ar e fumaça também. Também
deveriam estar lá as indicações das saídas em caso de acidente, com iluminação
de emergência. E aquilo que se chama de “segurança”, não deveria se limitar à
presença de alguns brucutus que julgam seu dever distribuir porradas em quem quiser
escapar sem pagar. A “segurança” deveria ser a segurança dos frequentadores,
antes de mais nada.
Ora, se algo estava no
projeto e não foi executado, pior ainda. Faltou aos bombeiros indicar as falhas
e fechar casa. Isso não foi feito.
Por outro lado, soltar
fogos dentro de um ambiente fechado no qual há material altamente combustível e
muita eletricidade circulando, não é coisa que se faça. Dizem que há legislação
que proíbe. Não importa. O bom senso proíbe, e basta. Ou deveria bastar.
É triste dizer isso
numa hora dessas, mas os frequentadores desses ambientes deviam ter também consciência
de onde estão se metendo. Acho que isso tem a ver com a falta de noção de
seus direitos que é típica dos brasileiros. Se a casa comporta mil
frequentadores, não entre em show onde estão comprimidos mil e quinhentos. Se
não há saídas de emergência, caia fora. É assim que acontecem esses acidentes
frequentes, por exemplo, em rios da Amazônia: o barco é para trinta passageiros, colocam nele
sessenta e tantos. É fatal: vai afundar. Há ganância e irresponsabilidade do
dono do barco, mas imprudência e falta de juízo por parte de quem embarca. E
omissão criminosa das autoridades que cuidam da navegação.
Em suma, é preciso ter
claro que estamos diante de situações de risco que exigem medidas preventivas.
De nada adianta lamentar depois do ocorrido, pois será tarde.
A questão é a seguinte:
onde estavam as “autoridades” quando foi feito o projeto, quando o projeto foi
executado, quando se liberou o alvará, quando não se fechou a casa, quando o
show foi autorizado, quando se aceitou que, ao invés de mil, entrassem mil e
quinhentas pessoas naquele lugar?
Portanto, por mais
triste e sofrido que seja o momento atual, já é hora de deixarmos de lado o
simples lamento diante do desastre. É preciso saber quem errou e – coisa difícil
no Brasil – punir quem errou. E, depois, tomar medidas preventivas que possam,
senão impedir, ao menos amenizar as consequências de um desastre.
O que eu não aguento
mais é a repetição irresponsável de que se tratou de uma “fatalidade”, como se
isso desculpasse todos os erros. Nada disso é fatal. É previsível, portanto
controlável em seus efeitos nocivos.
São grandes desastres,
é certo, mas o que os torna uma “fatalidade” é a incompetência, a omissão, a
ganância e o oportunismo de alguns empresários e das chamadas “autoridades
competentes”.
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