A surpresa dessa Copa
das Confederações – realizada em um Brasil em chamas – não foram as passeatas
nos arredores dos estádios nem os cartazes que a torcida exibiu. Muitos dos
cartazes mostravam críticas contundentes, algumas com fino humor, mas deixavam
claro uma coisa: futebol é futebol, ou seja, uma brincadeira. Política é outra
coisa. Sem mistura. Embora possam acontecer ao mesmo tempo, o que é bom.
Lembro-me disso porque
em 1970, quando o Brasil vivia sob os tacões da ditadura militar, o futebol foi
alvo de disputas políticas. De um lado, o ditador de plantão, Médici, queria
faturar o prestígio de Pelé no comando de um time fantástico. De outro lado,
parte da esquerda tentou impor como dever revolucionário torcer contra a
seleção. Debates, artigos e até livros foram gastos nessa polêmica.
Não deu certo.
A seleção – que saiu do
Brasil desacreditada e abaixo de vaias, é bom lembrar – entrou nos eixos lá no
México e conquistou “90 milhões em ação”, conforme se cantava na época. Ficou
uma lição: os ditadores tiraram sua casquinha no prestígio da seleção, mas nada
que mudasse os rumos do regime ou da oposição. Mesmo a esquerda mais ardida se
rendeu ao melhor time que o Brasil já formou.
Agora, na Copa das
Confederações, em meio a protestos que encurralam os governantes de plantão,
torcedores se vestem de amarelo e empunham cartazes criticando os rumos do país.
É bom que seja assim. Futebol é apenas um brinquedo. Não é bandeira
revolucionária nem alienação.
Mas, retornemos à
surpresa que mencionei acima.
O grande prazer foi o
Tahiti. Time de um pequeno país, formado por amadores, de futebol simples e
ingênuo. Levaram uma sacola de gols (vinte e quatro, se não erro nas contas),
mas receberam aplausos e carinho da torcida. Num mundo competitivo, pode
parecer estranho ou cruel ironia aplaudir um time que perde todas.
Mas não foi nem
estranho nem crueldade.
O Tahiti colocou em
campo uma das coisas mais deliciosas de qualquer esporte: o prazer de jogar, de
brincar, de competir. Ao contrário do que pensam os competitivos, o cerne da
dedicação ao esporte não é derrotar o adversário. Alguém será derrotado, é
claro. Haverá competição e um só vencedor. Mas o móvel é o prazer lúdico do jogo,
a grande farra da brincadeira, a ingênua prática que nos faz retornar à
infância.
Foi a materialização da
infância do futebol esse time do Tahiti. Jogam como todos nós jogamos um dia
quando crianças. Correndo atrás da bola, em gritaria, sorriso no rosto.
Com isso conquistaram a
torcida, que não os adotou por serem os mais fracos, como pode parecer. Fossem
apenas inábeis, acabariam vaiados. Conquistaram a todos porque, sendo amadores
em confronto com profissionais de primeira linha, estavam ali para se divertir.
E fizeram isso de cabeça erguida.
Jonathan Tehau, que fez o único gol do Tahiti
no certame, terá assunto para se exibir diante de netos e bisnetos. Todos
poderão contar que um dia jogaram contra Iniesta, Xavi, David Villa, Valdez, Forlan, Lugano, Suárez. Não é pouco.
O leitor conhece prazer
melhor do que ter histórias para contar a seus netos?
Excelente narrativa. Esta história devemos lembrar para contar aos netos: "Eu vi um time iniciante e sem nenhuma gloria se ver aclamado por uma multidão que curte de se delicia com este Esporte. Parabéns ao Roberto Gomes que tão bem consegui retratar este momento histórico!
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