Charge do imbatível Nani |
Desde quando surgiu nos
céus um sol enorme, de proporções federais, a vida naquele reino
distante se encontra nos limites de uma catástrofe. E foi num dia de sol forte
e devastador que o ministro de um dos quatrocentos e oitenta e nove ministérios
entrou correndo na sala da autoridade máxima. Veio aos berros:
- Não sei mais o que
fazer! Não sei!
Foi olhado de alto a
baixo pela autoridade máxima, o que deixou o ministro com a espinha congelada.
- E desde quando você
soube o que fazer?
- Ora, ora, autoridade,
nem sempre fico tão perdido assim. A situação atual é gravíssima.
- Já respondeu aos
reclamos feitos ontem pelo populacho?
Ele balançou a cabeça: respondera,
sim, com todos os recursos.
- E então?
- Acontece que contra a
iluminação que estamos sofrendo peneira não é uma arma eficiente, autoridade.
- Peneira?
- É o que restou em nosso
arsenal, como consta do meu último relatório, autoridade.
- Não queira me
comprometer! Não li seu relatório. Acha que devo ler tudo? Não sabe que eu já
declarei que não leio, tenho preguiça, além de ter coisas mais sérias das quais
me ocupar?
Então o ministro
explicou: gastaram todas as armas. Das mais simples, como bilhetinhos, até as
mais sofisticadas, como decretos e mensagens via internet. Deu em nada.
E acrescentou,
exaurido:
- O solão que nos
assombra continuou brilhando e iluminando tudo, autoridade. Só nos resta tentar
cobrir o sol com a peneira, segundo velho dito sábio de nossos ancestrais.
- Não use palavras
complicadas.
- Perdão.
- E daí?
- Daí que não funciona,
autoridade. Mesmo quando juntamos uma centena de peneiras, o sol continua a atravessá-las.
Além disso, são peneiras com uma telinha fina, de arame vagabundo, o sol as
aquece, elas derretem, não adianta.
A autoridade deu um
pulo de sua cadeira e andou de um lado para outro, chutando baldes e ministros
que estavam por ali.
- Assim não é possível!
Minha assessoria é formada por um bando de incompetentes! Como não conseguem
cobrir o sol com uma peneira?
O ministro tossiu,
pediu licença para falar, mas foi interrompido:
- Cale-se!
Calou-se.
- E aquele grupo de
mensageiros?
O ministro encolheu-se,
temeroso, e, com voz sumida, murmurou:
- Lamento, autoridade,
mas ninguém acredita neles. Pelo menos 70% não acreditam. Eles soltam as notas,
inclusive dólares, e artigos via eletrônica, mas não adianta. Parece que quem
lê mensagens eletrônicas anda se informando em outras fontes. Em resumo, não
acreditam.
A autoridade chutou uma
cadeira e os fundilhos de um oficial de gabinete e avançou na direção do
ministro:
- Do que eles precisam
para serem ouvidos?
O ministro engasgou,
tossiu:
- Mais verba,
autoridade máxima.
- Mais?!
- Trata-se de um óleo
para engraxar suas mãos, dizem eles. Sem isso não funciona.
- Então tá.
- Então tá, o quê,
autoridade?
- Mande retirar mais
verba.
O ministro exultou:
- Verdade?!
- Sim. Mas... – a
autoridade chegou um dedo no nariz do ministro – ...saiba e faça com que todos
saibam que eu não autorizei nada disso. Eu não sei de nada, compreende? Como
sempre. De nada!
- De nada?
- De nadinha.
E a autoridade máxima chutou
os fundilhos do ministro, que disparou porta afora e foi garimpar mais verbas
para comprar mais peneiras com as quais esconder o sol federal que iluminava
aquele reino à beira de um ataque de nervos.
Há doze anos, primeiro um molusco, depois um poste, tentam tapar o sol com peneiras. E está cada vez mais difícil. Aliás, é um costume bem brasileiro, de longa data, em todos os setores. Se há um problema, encontra-se um paliativo para atenuar o efeito e não eliminar a causa. Exemplo que me ocorre agora são as tais cotas nas universidades. Não havendo capacidade para resolver o imbróglio, tapa-se o sol com peneira. E com isso piora-se o ensino superior também e a qualidade do seu produto final: os profissionais que irão fazer o futuro do País. Melhor não enumerar outros casos pois o espaço seria insuficiente.
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